{"id":19769,"date":"2022-07-12T22:44:44","date_gmt":"2022-07-12T22:44:44","guid":{"rendered":"https:\/\/www.mmt.pt\/?p=19769"},"modified":"2022-07-12T22:46:21","modified_gmt":"2022-07-12T22:46:21","slug":"qualificacao-da-insolvencia-e-responsabilidade-dos-gerentes","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/www.mmt.pt\/artigo\/qualificacao-da-insolvencia-e-responsabilidade-dos-gerentes\/","title":{"rendered":"Qualifica\u00e7\u00e3o da Insolv\u00eancia e Responsabilidade dos Gerentes"},"content":{"rendered":"\n

Na senten\u00e7a que qualifique a insolv\u00eancia como culposa, o juiz dever\u00e1 \u201c(…) condenar as pessoas afetadas a indemnizarem os credores do devedor declarado insolvente no montante dos cr\u00e9ditos n\u00e3o satisfeitos, at\u00e9 \u00e0s for\u00e7as dos respetivos patrim\u00f3nios<\/em>\u201d devendo \u201cfixar o valor das indemniza\u00e7\u00f5es devidas ou (\u2026) os crit\u00e9rios a utilizar para a sua quantifica\u00e7\u00e3o, a efetuar em liquida\u00e7\u00e3o de senten\u00e7a<\/em>\u201d, conforme preceitua o Art.\u00ba 189 do C\u00f3digo da Insolv\u00eancia e da Recupera\u00e7\u00e3o de Empresas (CIRE).<\/p>\n\n\n\n

Aparentemente, parece tratar-se de um preceito que tutela de forma eficaz os interesses dos credores, mas a sua aplica\u00e7\u00e3o pr\u00e1tica n\u00e3o \u00e9 isenta de problemas. Em primeiro lugar, cumpre questionar quem \u00e9 que ser\u00e3o os benefici\u00e1rios dessas indemniza\u00e7\u00f5es, i.e<\/em>., ser\u00e3o os credores ou a pr\u00f3pria massa insolvente? No sil\u00eancio da lei, a doutrina divide-se: uma parte, considerando o estado do processo e a determina\u00e7\u00e3o dos cr\u00e9ditos reconhecidos e n\u00e3o satisfeitos, pugna que as indemniza\u00e7\u00f5es devem ser pagas \u00e0 Massa Insolvente (MI) na pend\u00eancia do processo ou, findo este, aos credores; outra parte, considera que estes valores, independentemente do estado do processo, dever\u00e3o ingressar na MI pois, a ado\u00e7\u00e3o de uma solu\u00e7\u00e3o diversa conduziria, muito provavelmente, atenta a quest\u00e3o temporal, \u00e0 possibilidade de surgirem viola\u00e7\u00f5es ao principio da igualdade de credores e \u00e0 inobserv\u00e2ncia da gradua\u00e7\u00e3o dos cr\u00e9ditos anteriormente realizada. No Ac\u00f3rd\u00e3o do Tribunal da Rela\u00e7\u00e3o de Coimbra de 27.04.2017, considerou-se que a senten\u00e7a de qualifica\u00e7\u00e3o de insolv\u00eancia culposa consubstancia um t\u00edtulo executivo, \u00e0 luz do disposto nos Arts.\u00ba 10\/5, 703\/1\/a e 704, todos do C\u00f3digo de Processo Civil. Mas, a quem caber\u00e1 prosseguir, neste caso, com a a\u00e7\u00e3o ou a\u00e7\u00f5es executivas destinadas ao cumprimento dessa senten\u00e7a? Mais uma vez, a lei \u00e9 omissa quanto a este aspeto e, por esse motivo, prop\u00f5e-se a invoca\u00e7\u00e3o do Art.\u00ba 82\/3\/b do CIRE, o qual disp\u00f5e que \u201c(…) durante a pend\u00eancia do processo de insolv\u00eancia, o administrador de insolv\u00eancia tem exclusiva legitimidade para propor e fazer seguir as a\u00e7\u00f5es destinadas \u00e0 indemniza\u00e7\u00e3o dos preju\u00edzos causados \u00e0 generalidade dos credores da insolv\u00eancia pela diminui\u00e7\u00e3o do patrim\u00f3nio integrante da massa insolvente, tanto anteriormente como posteriormente \u00e0 declara\u00e7\u00e3o de insolv\u00eancia<\/em>\u201d. Ora, se atentarmos ao disposto no Art.\u00ba 188\/1 do CIRE, relativo \u00e0 tramita\u00e7\u00e3o do incidente de qualifica\u00e7\u00e3o da insolv\u00eancia, o AI pode juntar Parecer de qualifica\u00e7\u00e3o de insolv\u00eancia (PQI) nos \u201c(\u2026) 15 dias ap\u00f3s a assembleia de aprecia\u00e7\u00e3o do relat\u00f3rio ou, no caso de dispensa da realiza\u00e7\u00e3o desta, ap\u00f3s a jun\u00e7\u00e3o aos autos do relat\u00f3rio a que se refere o Art.\u00ba 155 (\u2026)<\/em>\u201d. Este Parecer de car\u00e1ter facultativo, deixa de o ser no caso de ser apresentado requerimento de qualifica\u00e7\u00e3o de insolv\u00eancia por qualquer outro interessado, e, neste caso, o Parecer do AI \u00e9 obrigat\u00f3rio (vide Art.\u00ba 188\/3 do CIRE), podendo o juiz determinar a sua apresenta\u00e7\u00e3o \u00e0 luz do princ\u00edpio do inquisit\u00f3rio (vide Art.\u00ba 11 do CIRE), pois \u201c(\u2026) \u00e9 um elemento determinante na decis\u00e3o do incidente de qualifica\u00e7\u00e3o da insolv\u00eancia (\u2026)”<\/em>, conforme o Ac\u00f3rd\u00e3o do Tribunal da Rela\u00e7\u00e3o de Lisboa de 30.01.2018. Atento o car\u00e1ter urgente do processo de insolv\u00eancia, o legislador parece ter estabelecido aquele prazo de 15 dias uma vez que, com o Relat\u00f3rio do AI (Art.\u00ba 155 do CIRE), segue tamb\u00e9m o Invent\u00e1rio dos bens e direitos integrados na MI, com a indica\u00e7\u00e3o do seu valor, natureza e caracter\u00edstica (Art.\u00ba 153 do CIRE). Deste modo, o disposto no PQI dever\u00e1 logo determinar, em conson\u00e2ncia com o Invent\u00e1rio, a quantia a ser satisfeita pelos afetados pela senten\u00e7a de qualifica\u00e7\u00e3o de insolv\u00eancia e pedir ao Tribunal que a indemniza\u00e7\u00e3o devida seja computada atrav\u00e9s de simples c\u00e1lculo aritm\u00e9tico. A este prop\u00f3sito, a conjuga\u00e7\u00e3o das normas dos Arts.\u00ba 189\/2\/b e 189\/4, ambos do CIRE, \u00e9 controversa: parte da jurisprud\u00eancia considera que na atribui\u00e7\u00e3o da indemniza\u00e7\u00e3o dever\u00e1 ser apenas efetuada uma opera\u00e7\u00e3o matem\u00e1tica simples, i.e<\/em>., subtrair dos cr\u00e9ditos reconhecidos aqueles que j\u00e1 foram satisfeitos no processo de insolv\u00eancia, correspondendo o resultado ao valor da indemniza\u00e7\u00e3o devida pelos afetados pela qualifica\u00e7\u00e3o da insolv\u00eancia (Art.\u00ba 189\/2\/a do CIRE). Outra parte dos Tribunais, entende que a referida indemniza\u00e7\u00e3o dever\u00e1 ser calculada em fun\u00e7\u00e3o do grau de ilicitude e culpa manifestado nos factos determinantes dessa qualifica\u00e7\u00e3o legal. Esta \u00e9 a interpreta\u00e7\u00e3o do Tribunal Constitucional vertida no Ac\u00f3rd\u00e3o de 16.06.2015, proferido em sede de fiscaliza\u00e7\u00e3o concreta da constitucionalidade, o qual \u00e9 desprovido de for\u00e7a obrigat\u00f3ria geral. Contudo, independentemente da forma de realizar o c\u00e1lculo das indemniza\u00e7\u00f5es devidas pelos afetados pela qualifica\u00e7\u00e3o da insolv\u00eancia, no caso da empresa insolvente n\u00e3o possuir bens mas os seus gerentes (de direito ou de facto), administradores, contabilistas ou outras pessoas com liga\u00e7\u00e3o \u00e0 empresa terem sido condenados na obriga\u00e7\u00e3o de indemnizar os credores, o processo n\u00e3o dever\u00e1 ser encerrado por insufici\u00eancia de massa (vide Art.\u00ba 232 do CIRE). Estes valores dever\u00e3o ser pagos \u00e0 MI, que se arroga na titularidade desse direito, em representa\u00e7\u00e3o de todos os credores, atrav\u00e9s da respetiva a\u00e7\u00e3o executiva para pagamento de quantia certa. A legitimidade para propor estas a\u00e7\u00f5es ser\u00e1 do AI pois, se assim n\u00e3o fosse, os credores iriam ficar sujeitos \u00e0 regra do Art.\u00ba 794 do CPC, a qual \u201c(\u2026) visa impedir a sobreposi\u00e7\u00e3o de direitos sobre os mesmos bens, criando assim uma regra de prioridade temporal (\u2026)<\/em>\u201d, conforme disp\u00f5e o Ac\u00f3rd\u00e3o do Tribunal da Rela\u00e7\u00e3o de Guimar\u00e3es de 17.01.2019, sendo satisfeitos apenas os credores que mais r\u00e1pido conseguissem penhorar os bens dos condenados a indemnizar em senten\u00e7a de qualifica\u00e7\u00e3o de insolv\u00eancia. S\u00f3 depois de estes valores ingressarem na MI \u00e9 que o AI os ir\u00e1 distribuir, observando as regras aplic\u00e1veis \u00e0 liquida\u00e7\u00e3o e rateio, assegurando assim o tratamento igualit\u00e1rio entre credores, apenas cessando nessa altura as suas fun\u00e7\u00f5es no processo (Art.\u00ba 233\/1\/b do CIRE).  <\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"

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